domingo, 5 de janeiro de 2014

Ética da propaganda da indústria farmacêutica e o vício em remédios

A poderosa publicidade da indústria farmacêutica, a irresponsabilidade de muitos profissionais da área, a ignorância dos usuários e as negligências do governo e dos órgãos reguladores criaram um vício tão perigoso quanto o das drogas ilícitas: a farmacodependência.

Você pega as roupas de seu filho adolescente para lavar, e de repente encontra um cigarro de maconha no bolso da jaqueta. O sentimento é de decepção, medo, angústia, seguida da amargurada constatação: “Meu filho é um drogado!”.  Enquanto torce mentalmente para que ele não esteja viciado, você corre para seu armário de remédios e toma o calmante que usa nos momentos de tensão, se preparando para a difícil conversa que terá com ele. Neste mesmo armário é que você encontra o alívio para o corpo e a alma. São analgésicos, ansiolíticos para relaxar, anti-inflamatórios e até mesmo comprimidos de anfetamina usados para conter o apetite. O que você não sabe é que alguns desses remédios ingeridos de forma descontrolada podem causar mais danos à saúde e dependência que as substâncias conceituadas por você como “drogas ilícitas”.

Uso abusivo e crescente de medicamentos

“Do ponto de vista científico, não há diferença entre um dependente de cocaína e um viciado em remédios que contêm anfetamina”, diz o psiquiatra Dartiu Silveira, coordenador do Programa de Orientações e Assistência a Dependentes (Proad), da Unifesp. Então, como explicar a extrema intolerância social diante das drogas ilícitas acompanhadas de uma permissividade leviana diante de drogas prescritas pelos médicos? (Colocando o Brasil na 6ª posição no mercado farmacêutico mundial com um consumo de R$ 70 bilhões e com uma previsão para 2016 de ocupar a 4ª posição com R$ 110 bilhões). Afinal, precisamos mesmo de tantos remédios?

Segundo a maioria dos especialistas, a resposta é não. Apesar dos problemas de saúde da maioria dos brasileiros pobres e das doenças mais comuns entre a classe média e os ricos, o uso abusivo e irregular de medicamentos cresce numa velocidade preocupante. A quantidade de estabelecimentos farmacêuticos no nosso país é um bom indicador. Existem mais drogarias do que estabelecimentos que vendem pão no Brasil. São 83 mil farmácias, contra 64 mil padarias.

Fácil de adquirir e principal causador de intoxicação

É muito fácil adquirir medicamentos no Brasil. Seja nas próprias farmácias, ou por telefone e até mesmo pela internet, com ou sem receita. Balconistas e técnicos em farmácia diagnosticam doenças e “tratam” pessoas com remédios da moda, dos analgésicos e anti-inflamatórios aos fármacos para emagrecimento e antidepressivos. Segundo alguns especialistas, apenas 30% dos medicamentos vendidos no Brasil são com prescrição médica.

As consequências disto são resultados alarmantes: segundo dados do Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas (Sinitox), por mês, no Brasil são registrados mais de 4.000 casos de intoxicação por remédios, superando os acidentes com animais peçonhentos, produtos químicos e pesticidas. Somente o Hospital das Clínicas de São Paulo registra mais de 600 casos por mês e o mais preocupante é que 35% são crianças. As principais causas das intoxicações são: automedicação, superdosagem, prescrições e manipulações erradas, acidentes domésticos (principalmente casas com muitos remédios, de sabor doce, embalagens coloridas e com acesso fácil para crianças) e tentativas de suicídio.

Mas este problema não é de exclusividade apenas do nosso país. Nos Estados Unidos, mais de um milhão de pessoas todos os anos são levadas aos hospitais após a ingestão de medicamentos. Este e outros fatos levaram em 2004, pesquisados da Universidade de Nova Iorque a fazerem um estudo que revelou dados assustadores. Os resultados mostraram que os laboratórios que forneciam medicamentos para o país gastaram em um ano 58 bilhões de dólares com publicidade e promoções e apenas US$ 32 bilhões com pesquisa e desenvolvimento.

Outro levantamento revelou ainda que o monopólio dos medicamentos aplica cerca de 90% dos recursos para pesquisa e desenvolvimento de remédios contra doenças que, como o diabetes (que atinge 10% da população mundial), possibilitam um tratamento caro e prolongado. Por outro lado, moléstias infecciosas como a malária, que atinge 300 milhões de pessoas por ano, ou a tuberculose, que mata 2 milhões de vidas anualmente, e para as quais não se lança um medicamento há 30 anos, são deixadas em segundo plano, pois oferecem menor lucratividade.

Propaganda: a alma do negócio farmacêutico

Assim como os fabricantes de cerveja, o monopólio farmacêutico não admite controle, ainda que formal, sobre a propaganda. Impõe forte oposição às propostas da ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para atualização da regulamentação da propaganda de medicamentos, e nesse esforço tem a ajuda do poderoso mercado publicitário. No último ano, a indústria farmacêutica brasileira gastou cerca de R$ 3 bilhões com publicidades em televisão, rádio, outdoors, patrocínios e eventos.

Cerca de R$ 1 bilhão dos investimentos publicitários foram somente com remédios OTC (Over-The-Counter), medicamentos isentos de prescrição médica como Advil, AAS, Anador, Aspirina, Cataflam, Multigrip, Neosaldina, Novalgina, Tylenol, dentre centenas de outros antiácidos, vitaminas, produtos fitoterápicos, descongestionantes nasais, analgésicos e até colírios.

O chefe do Centro de Assistência Toxicológica (Ceatox) do Hospital das Clínicas, doutor Anthony Wong alerta: “Não há remédio 100% seguro. Os analgésicos podem provocar intoxicações e problemas graves, apesar da fama de grande margem de segurança e poucos efeitos adversos”. Segundo ele a combinação de certos OTC podem causar hemorragias gastrintestinais e eventualmente nefrite (inflamação dos rins). “A combinação de vitaminas com anti-inflamatórios ou analgésicos são formulações absurdas do ponto de vista médico e farmacêutico. Os riscos são maiores do que os benefícios.”

A divulgação e promoção de medicamentos junto à classe médica são feitas de diversas maneiras, com destaque para os milhares de representantes que frequentam os consultórios médicos para oferecer informações, amostras, brindes e até decorações da clínica, como já denunciado em uma reportagem da TV Bandeirantes em 2008.

Além da publicidade feita em meios de comunicação, algumas empresas patrocinam seminários, simpósios e congressos. A Organização Mundial da Saúde recomenda que o apoio a profissionais da saúde para participar de simpósios regionais ou internacionais não seja condicionado a qualquer obrigação para promover produtos farmacêuticos, porém esta recomendação tem sido mundialmente ignorada.

Em 2009 a ANVISA criou uma nova regulamentação sobre propaganda de medicamentos e periodicamente cria atualizações (as chamadas RDC – Resoluções da Diretoria Colegiada). A partir deste ano também se intensificaram as fiscalizações das publicidades e das informações contidas nas embalagens dos medicamentos, principalmente os de venda livre (OTC). Mas ainda há empresas que desrespeitam as resoluções. Porém, as que são autuadas pagam multas irrisórias em vista dos investimentos em propaganda e faturamento.

Fica muito claro que o principal interesse dessas empresas é apenas o lucro, não demonstrando interesse algum em fazer investimento nos locais onde realmente há necessidade de medicamentos, como para as pandemias em países subdesenvolvidos.

Para finalizar, no gráfico abaixo fica bastante evidente o desequilíbrio no faturamento mundial da indústria farmacêutica. Enquanto a população de países desenvolvidos e emergentes gastam bilhões de dólares com ansiolíticos, antidepressivos, antigripais e medicamentos para tratamentos longos e caros, as populações dos países subdesenvolvidos sofrem com enfermidades que os laboratórios não têm interesse em investir no desenvolvimento de remédios para as doenças, pelo fato das populações destas localidades não possuírem um capital de interesse para eles.




Marcos Vasconcelos


Fontes e referências:

(1)   ANVISA. Informações e dados disponíveis em: http://portal.anvisa.gov.br/wps/content/Anvisa+Portal/Anvisa/Inicio/Medicamentos

(2)   Centro de Assistência Toxicológica – Ceatox. Dados disponíveis em: www.ceatox.org.br

(3)   IMS Health, empresa que audita o mercado farmacêutico mundial. Site: http://www.imshealth.com

(4)   Jornal A Nova Democracia – “Laboratórios têm a dosagem certa da corrupção”. Texto disponível em: http://www.anovademocracia.com.br/no-47/1885-laboratorios-tem-a-dosagem-da-corrupcao

(5)   Jornal Folha de São Paulo – “Vício em remédios supera abuso de drogas ilícitas”. Texto disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/saude/sd2502201001.htm

(6)   Pyxis Consumo – Ibope Inteligência (abril de 2013). Dados disponíveis em: http://www.ibope.com.br/pt-br/noticias/Paginas/Venda-de-medicamentos-deve-movimentar-70-bilhoes-no-Brasil.aspx


(7)   Radis, Comunicação e Saúde – “Propaganda de remédio faz mal à saúde”. Texto disponível em: http://www6.ensp.fiocruz.br/radis/revista-radis/28/reportagens/propaganda-de-remedio-faz-mal-saude

Um comentário:

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